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Ice AVenturaS

A Aventura de estar no topo do meu Iceberg... Ou seja, da minha mente! Pensamentos, reflexões, experiências, assuntos sérios ou maluquices da pessoa, mãe e psicóloga... Uma viagem talvez alucinante e meio louca!

Ice AVenturaS

A Aventura de estar no topo do meu Iceberg... Ou seja, da minha mente! Pensamentos, reflexões, experiências, assuntos sérios ou maluquices da pessoa, mãe e psicóloga... Uma viagem talvez alucinante e meio louca!

E em modo Zombi, eu respondi...

Lembram-se deste post?

 

Pois... Entretanto, o maridão já esclareceu precisamente quais as palavras simpáticas que eu lhe disse e, o demoveram da luta inglória de me fazer levantar para o acompanhar até à cama...

 

E, confesso que me ri tanto, que me vieram as lágrimas!
Aliás, o espetáculo foi tal, que o nosso filho começou a refilar comigo por achar que me estava a rir do pai...

Eu disse-lhe:

 -“ Se eu não te estou a chatear, porque me estás a chatear a mim? Deixa-me! Já vou.”

 

Até em modo Zombi, consigo argumentar com toda a lógica! A mim, faz-me todo o sentido... Não percebo o problema dele.

Será que ando a levar cotoveladas nas costas durante a noite?

Ontem à noite adormeci no sofá... Algo que desde que o B. nasceu, passou de raro a frequente.

No meu estado de sono zombi, tenho ideia de o meu marido me tentar acordar e convencer a ir para a cama.

Uma insistência a que reagi com extrema simpatia com a resposta de "Já vou! Deixa-me estar! Não me chateies!" (ou algo do género que, em modo zombi, já não recordo bem).

 

E, de repente, eram 7h da manhã!

Ora, aqui é que começou a minha dúvida...
De um modo geral, acordo toda perra e dorida, pois tenho problemas de coluna. Mas hoje, acordei fresquinha!

 

Será que o meu sofá é mais ortopédico do que o "colchão de corrida" que tenho na cama?

Ou será que o meu marido me anda acotovelar as costas durante a noite? Eu tenho sono pesado, se calhar, ele conseguia fazê-lo sem me acordar... Hummmmmmm.

 

Toma lá para aprenderes! Belo exemplo...

Uma pessoa vive sob o lema de "lead by example", ou lidera pelo exemplo, e julga estar a praticar este lema...

E depois tem um filho e ouve:

- "mamã não canta à mêja!" (mesa)

- "papá não fala ca boca cheia!"

- "ah, ah, o B. avijou papás!" (avisou)

 

...

 

É como quem diz:

- "Tomem e embrulhem!" 

Medo de uma sociedade que mede o valor de uma vida...

Eu sou um dos que choraram ao ver aquela foto, e provavelmente por más razões. Antigamente só lacrimava no cinema, mas hoje em dia comovo-me com facilidade, e é possível que ainda acabe como Jorge Sampaio, olhos marejados e vista sazonalmente embaciada, para meu grande embaraço. Suponho que a culpa seja dos filhos, que me fragilizaram a existência, e admito que as minhas lágrimas sejam lágrimas feias, de pura identificação pessoal e cultural: quando olhei para o corpo de Alan Kurdi não foi, de facto, ele que eu vi. Foi um dos meus filhos, a quem já vesti muitas vezes t-shirts daquelas e calções daqueles. Foi a Rita, a minha amada Rita, que fez três anos cinco dias antes de Alan morrer. Os cínicos têm razão: foi pelos meus filhos que chorei, e que continuo a chorar, enquanto escrevo estas palavras. Foi eles, e não um pequeno e desconhecido curdo, que imaginei a fugirem de mim na noite escura.

in "Os mortos não são todos iguais", João Miguel Tavares (Público)

 

E, pronto... É isto! Lamento, mas é isto que ainda me põe lágrimas nos olhos ao recordar aquela imagem.
Mas é também o resto deste texto, que subscrevo na íntegra, pois sei que identificar-me-ei com qualquer ser humano naquelas condições, sabendo que não acontece só aos outros... Por isso, nem que seja "por más razões" (a identificação e projeção), estarei do lado dos que choram por um menino caído à beira-mar.

 

E é também o medo (a certeza, na realidade) de que um dia possa ser eu, possam ser os meus... Independentemente de religiões, credos, ideologias políticas... Nada me garante que não serei.
São pessoas que fogem à morte e à guerra... Pessoas como eu e como os meus... Pessoas.

 

E se falamos de medos...
Sinceramente, tenho mais medo de vir a ser eu e os meus e ninguém nos valer, neste mundo em que o valor de uma vida humana parece ser algo quantificável e qualificável, do que medo de valer aos outros por serem pessoas como eu, mas com ideias diferentes das minhas...

 

O que eu tenho mesmo medo é de viver e ser conivente com práticas que dão força e ajudam argumentos relativos ao valor de uma vida humana... pois um dia pode ser a minha vida a ser avaliada e, nada poderei fazer ou dizer, pois também eu andei a avaliar a dos outros (nem que seja por ver e nada fazer para o impedir).

 

Sejam esses argumentos baseados em religiões, ameaças de terrorismo, em idades ("é velho demais, não vale a pena gastar dinheiro em terapias e tratamentos"), em possibilidades monetárias ("não tem dinheiro para pagar a vacina, por isso os filhos dele não vão ficar protegidos do risco x"), em localizações geográficas ("a grávida perdeu a criança, porque o hospital mais perto era a 150km, não conseguiu chegar lá a tempo e houve complicações no parto que ocorreu a meio da viagem"), ou outros...

 

Sim, porque em qualque dos casos, seja nos últimos exemplos que dei (mais ligados à realidade portuguesa), ou nos primeiros, trata-se disso: da decisão de avaliar o valor de uma vida.
E esta decisão, para mim, devia ser moral e não política ou económica... e nesse campo (moral), uma vida é uma vida.

Hoje vou sair de camisa de dormir!

Como é nosso hábito, de manhã, quando ele começa a chamar, vamos buscá-lo para um bocadinho de mimo na nossa cama e só depois nos levantamos.

 

Hoje, levanto-me e ouço:

- "Tão gia, mamã! Tão gia, mamã!" - (gira, ou seja)

 

E, pronto! Hoje vou sair à rua com a camisa de dormir que me põe tão gira aos olhos do meu filho!

Ou talvez não. Mas é tão bom levantarmo-nos com os elogios sinceros de uma criança!

Einstein, de certo modo, tinha ainda mais razão do que julgava...

Há uns tempos falava com uma amiga, também psicóloga e com outras quantas caracterísitcas e coincidências que nos juntaram, mesmo que a distância nos separe e por vezes, falemos bem menos do que gostaríamos...

 

Falávamos sobre luto e perda. Falávamos sobre morte e vida.

 

A perda supera-se de algum modo...
Atribui-se-lhe um sentido e, por vezes, até conseguimos ver aspetos positivos na crise, no momento, naquilo por que se passou, na oportunidade de mudança e crescimento que advém sempre de uma crise.
E chegam as desejadas "suaves memórias" que ficam após um processo de luto bem-sucedido e emocionam, mas não desequilibram.

 

A perda faz parte da vida, tanto como a morte faz. E como qualquer outro acontecimento de vida, marca, muda e faz-nos ser o que somos.

 

No mínimo, a perda faz-nos confrontar com a realidade de que o temos por certo, não o é. E que, onde existe amor, também existe a hipótese de o perder. Faz-nos perceber que onde há vida, há morte. Sem regras, preferências, etnias, cores, políticas, desejos, idades, necessidades... É uma realidade: a morte é inevitável.

 

E essa constatação (ao sair da perda) pode ser um impulso positivo para a vida, para o saber aproveitar e valorizar cada momento.
Mas carrega consigo também um medo... O medo de voltar a perder...
Por isso, se diz que sabemos que um luto foi superado, quando a pessoa se predispõe a amar novamente, a ter um "novo" amor...

 

Falávamos sobre tudo isto...
E falávamos da vontade de trazer ao mundo uma nova vida... de ter um bebé...
As duas que já perderam… uma já mãe, outra com o desejo, mas também receio...

 

Receio de quê?

 

De se desestruturar novamente ao trazer um novo ser ao mundo. Algo que já de si é considerado um momento de possível desequilíbrio no ciclo vital da família. Um momento em que ocorre uma mudança radical no seio da família, em que de dois se passa a três e os três são postos à prova, procurando encaixar-se, adaptar-se e estruturar-se na sua nova vida e novos papéis.
E, um momento também de união na família, de necessidade de suporte, de apoio, em que a recordação dos pais dos “novos pais” (agora avós) e a necessidade do seu apoio é constante.
Mas quando os pais já não estão, fica apenas a recordação numa altura já de si emotiva e, a constatação da falta que fazem. E sempre farão! (Nem imaginam quantas pessoas, com 80 anos e mais, me falaram emotivamente acerca da falta que lhes fazia ter ali a sua mãe ou pai!).

 

Por isso, sim. Medo de nos desestruturarmos, mesmo após o luto feito, quando um acontecimento de vida importante e forte nos traz tantas memórias e nos transporta para novo turbilhão de emoções, ainda que diferente.

 

Eu, já mãe, também tive esse receio antes.
Senti a falta e emocionei-me ainda grávida.
Emocionei-me, recordei, chorei e ri, já mãe.
E, ainda, me emociono, recordo, choro e rio. Com a certeza de que faz parte…
Faz parte de mim, da minha história e do que sou. Sei que vou sentir esta (e outras) perda ao longo da vida e que haverão sempre momentos mais difíceis, em que tudo daria para trazer aquela(s) pessoa de volta e em que a recordação é muito forte e sentida…

 

Mas sabem?
Em parte, eu sinto que nunca a(s) perdi mesmo… Enquanto tiver memória, não terei perdido e quererei sempre falar sobre ela(s), recordar e contar estórias boas e más acerca do que tive a sorte de com ela(s) viver! Incomode isso os outros ou não… Não me importa.

 

E, quando olho para o meu filho, aí… Aí, sim, tenho a certeza de que não a(s) perdi de todo!
“A genética é tramada”, como se diz e os padrões educativos, morais e comportamentais também… Porque aprendemos muito a ver os outros, a imitar os nossos modelos. E, se dúvidas tínhamos das nossas similitudes com os nossos progenitores, não existe melhor espelho delas que um filho!

 

Por isso, com o meu filho emocionei-me, recordei, chorei e ri.
Talvez esteja um pouco mais emotiva, mas também mais compreensiva e tolerante. De uma coisa não tenho dúvidas! Estou num curso intensivo de como adquirir “carradas e carradas” de paciência. Bem preciso!
Também sei e sinto que fiquei mais sensível a notícias e assuntos relacionados com crianças doentes, a sofrer, mal tratadas, vítimas de violência, a morrer ou mortas… Trazem-me o medo… o medo de voltar a perder e o receio de não ser capaz de aguentar mais essa perda. E, aí, como não se pode estar sempre a olhar para o sol (apesar de sabermos que está lá), confesso querer “fechar os olhos” e desviar o olhar, desejando muito o que é certeza (não certa) para muitos: “só acontece aos outros”. Porque só a ideia da perda, já dói… Porque com o amor, vem o medo de o perder…

 

Mas a verdade é que ganhei um tesouro que me faz ter a certeza que Einstein, de certo modo, tinha ainda mais razão  do que julgava: na vida, "nada se perde, tudo se transforma”…
Nada perdi, pois está em mim e será transportado para as novas gerações, num diferente formato, mas está lá.

 

Sim, com frequência, recordo a minha mãe e emociono-me (sem desestruturar). Seja na constatação da falta que me faz a mim ou ao neto que nunca viu, seja no suspiro que me sai de “É castigo..” (como que dizendo: “ela tinha paciência para te aturar, e eras bem pior, por isso, anda! Arranja-te!” ).

 

Na realidade, sendo mãe ou não, recordar-me-ia de qualquer modo e teria igualmente saudades.